18/06/2010

Janela

[Bom dia, leitores!! Bem, desculpa, mas hoje não postarei mais um capítulo do conto. Sei que alguns estão já desesperançosos sobre a continuação da história. Garanto que teremos continuação amanhã!! rs Aconteceram algumas coisas... e tudo que eu escrevia, parecia digno de ser usado no banheiro. Enfim,... Hoje acordei com uma frase na cabeça e escrevi um textículo. rs Espero que gostem. E aguardem para amanhã a continuação do conto. Beijos, agradecida. Zig. ]



Janela

Abro a janela. Encosto-me nela ainda com a cara inchada dos meses adormecida. Já recobrando o ânimo com os poucos raios de sol que varam as negras nuvens que pairam no céu, avisto 2 moças na rua; uma a subir e a outra, a descer.

A que desce me apareceu assim, no meio do desânimo, do desconforto da própria vida. E de dois contatos lisonjeiros e regados por algumas boas gargalhadas, eu não soube dizer “não” ao convite daquela tarde tão corrida. Naquele começo de noite, sob a lua a surgir devagar no céu azul marinho, me beijaste. Soavas como o início de um novo ciclo que eu me propunha a iniciar. Ciclo de desapego, de leveza, de calmaria em meu mundo sempre tão conturbado e agredido. Minh’alma já tão castigada e solitária ansiava por alguém que pudesse me ser mais companheira que amante; mas, obviamente, não me negaria a amante...! Do mesmo jeitinho que o início se deu, deu-se o fim; inesperadamente. Línguas vorazes, malditas, leprosas e levianas. Mentes que deturpam, enojam. Ingenuidade minha achar que eu tinha amigos. O peito que respirava o aroma adocicado que vinha daquele sorriso discreto e tímido, lamentou ao ver a oportunidade de algo tão singelo e bom lhe escapar por entre os dedos. “Será impossível viver algo tranqüilo?”- questionei-me. Até agora, debruçada nesta janela, o carteiro do tempo não me chegou com a resposta para esta e tantas outras perguntas. E lá se vai ela, ladeira a baixo. Com o violão nos braços, vai exorcizar os maus sentimentos, os desamores e amores que lhe invadem o coração. Os cabelos negros balançam seduzindo a cada passada naquela ladeira. Ah, se eu soubesse que tudo acabaria com tanto desgosto... Ah, se eu soubesse. Não teria aceitado aquele convite. Vendo-a já distante, uma cantiga volta do fundo da memória. “Se esta rua, se esta rua fosse minha eu mandava, eu mandava ladrilhar... Com pedrinhas com pedrinhas de brilhantes...”. Eu mandaria sim, só para ter novamente aquele sorriso, que um dia te dei. A chuva resolveu cair naquele instante, mas não me prestei a fechar a janela.

A que subia, passa sempre a minha porta. Avistou-me na janela e sorriu, segurando em meus olhos seu olhar. Com eles vem uma canção ao meu ouvido. "Corre solta suassuna noite, tocaia de animal que acompanha sua presa. Escravo da sua beleza, daqui a pouco o dia vai querer raiar...". Constranjo-me fácil, esquivo o rosto, mas me permito um sorriso dar. Ela sempre fez isso; olhar, sorrir e ir. Por muitos dias vivi a querer-lhe imensamente. Tem os ombros adornados por estrelas, os olhos marcados de preto, a boca insinua-se a cada palavra dita, o corpo inspira lascívia e desejo. Atrai olhares por onde anda, arranca elogios dos transeuntes. Jamais me passaria em branco um ser com tamanha beleza e intensidade. Trocamos certa vez algumas palavras, mas teus olhos falavam mais que seus próprios lábios; e que lábios...! O tempo correu, e quando menos imaginei me veio vestida de negro com as curvas marcadas, assunto puxar. Ainda não entendo como e muito menos porque, mas me tiraste do chão naquela noite trôpega. Vieste-me com uma conversa fiada e eu, mesmo destreinada, não te deixei escapar. Só há um único infortúnio; minha também não serás. Seu corpo pertence a outro; sim, no masculino; e dele é certo que não te largarás. “Por que estás com ele se não és feliz?”- perguntei. E esta resposta o carteiro do tempo ainda não soube lhe dar. Me dói te ver assim, angustiada, reprimida, pela metade. Encorajo-te a se libertar, mesmo que não seja para ficar comigo. Coisa mais triste é viver pela metade aquilo que somos por inteiro. Subindo a ladeira ela continua, mesmo debaixo do toró que se propôs a cair, vira volta e meia para me fitar. Antes mesmo que ela termine a subida, fecho minha janela. O vento frio da solidão me faz bater o queixo. Dois passos dei dentro de casa e ouço a campainha tocar. Era o menino de recados dizendo para encontrá-la ainda hoje, na mesma hora e lugar. Dei-lhe um trocado e com a mão, sua cabeça afaguei.

Sentada numa cadeira preguiçosa, de cigarro nos dedos, concluo que seja melhor assim... uma a subir e outra a descer, mas sem que nenhuma pare a minha porta e peça para ficar. Pois, meus dias são longos, minhas noites gélidas, minha história tortuosa e meu futuro, sabe lá o que me reserva. Sou assim, um dia de cada vez. Companheira genuína só a solidão, que com ela já me acostumei. Agora, ela me chama para a cama, para novos longos meses adormecida. Não sou eu nem Cinderela, nem Margarida. Sou apenas mais uma que possui coração disposto a flertar com o amor.

[Eu só precisava respirar um pouco.]

Zig.